segunda-feira, 6 de julho de 2009

Direito Universal da Humanidade

Se toda cultura humana fosse hoje destruída, se todo o conhecimento que o homem construiu ao longo da História se perdesse, e o homem voltasse a seu estado primitivo, não seria ele apenas mais um animal? Um animal racional lutando entre tantos outros, pela sua sobrevivência?

Dentro de nós ainda estaria todo nosso potencial humano; mas quantos milhares de anos precisaríamos para tornar manifesto novamente que somos muito mais do quê animais? Quanto tempo precisaríamos para abandonarmos mais uma vez o Estado Natural e reconstruirmos o Estado que nos permite realizar toda nossa humanidade?

Quanto precisaríamos para nos tornar plenamente humanos, reconstruirmos nossas civilidade, nossas civilizações? Nos apropriarmos novamente da nossa evolução, transmitindo nosso legado não apenas pelos genes, mas através da maior invenção humana: a Educação. Quantas lutas, quantos conflitos, quantos sacrifícios mais precisaríamos para podermos realizar neste mundo, tudo o que somos: Humanos.

A Humanidade é nossa essência e nada, nem ninguém pode tomá-la. Porém a sua manifestação, o seu exercício, não ocorre naturalmente sem o esforço e sacrifício dos próprios homens.  A Humanidade é um processo de evolução, de constante aperfeiçoamento, que se principia quando abdicamos da violência, quando abandonamos nosso estado primitivo e constituímos a Polis, o Estado Civil; e que cessa toda vez que somos obrigados a lutar violentamente por nossa vida, a nos valer dos nossos instintos para sobrevivermos.

A guerra e a miséria são condições desumanas, porque destroem o estado civil, reduzindo o homem a sua condição mais primitiva. O processo de desumanização promovido nestes estados de desgraça, não impede apenas a realização humana dos indivíduos envolvidos, mas de todos, porque a humanidade não se realiza no plano individual, mas no coletivo.

A Humanidade é um estado de espírito que só manifesta nas relações humanas. Uma condição que só se realiza quando as pessoas podem abdicar de seu estado primitivo, onde a violência é natural, e constituir em comum acordo um estado de paz: o Estado Civil, tornando os semelhantes mais próximos, naquilo a quê chamamos CIDADANIA.

Mas, será que ainda hoje, não existem seres humanos postos em condições de se verem obrigados a lutar violentamente pela sobrevivência, às vezes até uns contra os outros?  E não me refiro às guerras longe dos nossos olhos, mas da miséria que bate na nossa porta; cai em nossas calçadas; pede dinheiro nos faróis; e às vezes irrompe em ódio puro contra inocentes. Ou serão mesmo invisíveis, as pessoas que vivem entre nós?

Ao observar o comportamento humano principalmente nos grandes centros urbanos, podemos verificar a capacidade humana de suportar as mais adversas condições, principalmente psicológicas. A capacidade que temos de nos desligar de uma realidade insuportável, não apenas para quem sofre, mas para quem a presencia. Sim, o processo de desumanização não está somente no indivíduo privado da dignidade, mas naqueles que também são obrigados a assistir cotidianamente o sofrimento de seu semelhante, até o ponto da completa desensibilização.

Talvez no plano da sociedade, o maior dano causado pela miséria é a promoção de um estado coletivo de indiferença. Pergunto-me muitas vezes, qual será o efeito ao psicológico de uma criança esta negação cotidiana desse instinto tão primário de coletividade, presente até mesmo nos animais mais selvagens?

Peço então que olhemos para nossos semelhantes e consideremos seriamente a sua condição humana. Não com indiferença, nem tão pouco com misericórdia, ou piedade, pois estes sentimentos são apenas o outro lado da moeda da discriminação. Implícito a todo sentimento de pena, há um sentido de superioridade imperceptível àquele que sente, mas terrivelmente humilhante e ofensivo à dignidade daquele que assim é visto. Olhemos então para as pessoas, estas ou aquelas, simplesmente como elas são: pessoas, iguais a nós em essência, diferentes talvez em condição.

Alguns talvez perguntem: mas não seria esta condição uma escolha? Certamente que sim onde as oportunidades mínimas são dadas a todos. Mas são estas oportunidades mínimas realmente dadas a todos?  Contudo, por hora, esqueçamos a questão da igualdade e imaginemos que não seja a justiça imprescindível ao Estado Civil. Tomemos então esse mundo imaginário sem justiça apenas sob o prisma das causas e conseqüências: Neste mundo, quê diferença faz para aquele que perde sua vida com violência se quem a toma foi ou não premido pela necessidade ou pela ganância? Quê diferença faz se a condição miserável que leva uma pessoa a violência é culpa dela ou não?

Neste sentido, a questão é meramente de raciocínio: Devemos acreditar ingenuamente que os miseráveis façam o favor de minguar até a morte na sua fome e miséria sem nos perturbar? Ou devemos nos armar e nos trancar em nossas casas, vivendo em eterno estado de sítio, onde cada desconhecido é um suspeito? Não seria mais inteligente garantir as condições para evitarmos que ninguém atente contra outro ser humano premido pela necessidade? Claro, existirão ainda pessoas que atentarão contra a vida por outros motivos, mas quanto aos necessitados, não seria melhor tirá-los das condições que podem levá-los a marginalidade? Considerando a questão apenas do ponto de vista prático, não seria melhor para todos retirarmos ao menos estas pessoas dos números da violência?

Porém voltando ao estado civil de fato, onde a Justiça é fundamental: não seria melhor termos a certeza que ninguém chegou a essa condição marginal por falta de escolhas, ou pior, premido por suas necessidades vitais? Nossos juízos e julgamentos não seria mais justos se tivéssemos a certeza absoluta que ninguém foi condenado por um crime que talvez jamais ocorresse em outras circunstâncias? Ou por outro lado que indivíduos torpes não poderiam se esconder atrás das brechas da desigualdade social?

Entretanto não devemos limitar nosso entendimento da Renda Básica de Cidadania, as questões da justiça nem tão somente da distribuição de renda compensatória. Seja como compensação das desigualdades históricas, seja como uma compensação a instauração da propriedade privada. A Renda Básica de Cidadania não deve ser vista apenas como um programa de distribuição de renda,mas como um direito universal e tão natural quanto à própria propriedade privada enquanto consideradas em seu sentido de a condição material mínima para a subsistência do ser humano.

A Renda Básica de Cidadania deveria está explicitamente manifesta entre os Direitos Universais do Ser Humano porque não é um direito ao ócio, mas o direito à condição mínima necessária para viver, aprender e trabalhar. Dentro do processo de humanização, mais do que a garantia de um princípio de Justiça, é a garantia da própria natureza humana, a medida que fornece as condições mínimas à negação do estado animal de luta  pela sobrevivência. Um aperfeiçoamento do processo evolutivo em direção a manifestação plena do espírito humano nos princípios da liberdade, igualdade e fraternidade que embasam o conceito de cidadania. A Liberdade na incondicionalidade. A Igualdade na indiscriminação. E a Fraternidade no direito a herança universal.

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